sexta-feira, dezembro 08, 2006

Ele estava deitado em sua cama. Olhando para a brancura sombreada do teto. E pensando. Sua insatisfação incontida o mantinha neste provisório momento de aparente inércia, mas na verdade o que ele precisava e não podia abrir mão de jeito nenhum eram os seus momentos de nada. Parecia que ninguém entendia o quanto ele precisava não fazer nada. O quanto que sem esses momentos a sua vida não fazia o mínimo sentido. Por isso o seu trabalho muitas vezes se tornava um fardo com um peso insuportável, pois o fazia acordar sem querer, fazer coisas que não queria fazer, no momento inoportuno, enfim, tudo isso, todo esse martírio para que a continuidade de sua sobrevivência fosse garantida com seu salário minguado que o fazia se irritar. Mas agora não, ele estava ali, do jeito que gosta de ficar tantas vezes, ali, naquele silêncio morno e calmo de uma tarde de primavera. Pensa em como a falta de compromissos, mesmo que seja fictícia e momentânea, lhe fazia bem, praticamente o rejuvenescia. Muita gente achava que isso era depressão, mas não entendiam o que de fato se passava. Volta e meia ele pegava o seu velho lápis de cor azul e se punha a escrever, rabiscando algumas anotações sem nexo, fragmentos de pensamento. Ele gostava de ver a cor das palavras, não se importava com o sentido. Gostava de se deitar no chão também, sentir a superfície impenetrável, lisa, dura e fria em contato com suas costas, um leve tremor o fazia fechar os olhos de rápido prazer. Quando convinha ele gostava de algum tipo de exercício físico, o que mais gostava era de correr, correr até a exaustão, adorava ficar exausto, só para ter o prazer de descansar. Entretendo-se de forma solitária ele fazia desenhos nas paredes de seu quarto às vezes, forjava criatividade, queria ser escritor, mas sofria pois pensava que um verdadeiro escritor tinha que ser uma fonte inesgotável de idéias pulsantes. Ele em compensação não era sempre que tinha idéias, por isso talvez gostava de ficar sem fazer nada, esperando paciente, afoito uma idéia. As idéias não vinham, então ele se punha desesperado a rabiscar na parede, riscos sem finalidade de compor forma alguma, sem técnica e nem bom gosto, sem gênio e nem criatividade, o que era “ser bom”? Sua transpiração se mostra como resultado do esforço de seus músculos que quase tremiam de força contra a parede, seu corpo se esfregava à parede enquanto ele fazia os seus rabiscos sem sentido. Ele tinha vontade de gritar, mas era tímido, então riscava, riscava... até chorar e ir caindo se arrastando parede abaixo e ali ficando um tempo. Nestas horas ele não queria idéia nenhuma, só queria ficar ali, naquele instante de nada, sentindo a plenitude naquele pingo de existência vazia que, dependendo de seu estado de humor, lhe causava pânico. Mas neste momento não, ele estava ali encostado naquela parede rabiscada incoerente pelas suas mãos, sentindo sua respiração mais próxima de si, queria ficar ali. Cansou e deitou no chão. Se sentia um adolescente que já não tinha mais idade para ser, isso o machucava bastante, era injusto ele não poder ser um adolescente descompromissado e revoltado e triste! Tinha tanta alegria em poder ser assim, lembra com nostalgia esses momentos em que o futuro não era algo com o que se preocupar, pois era jovem demais para isso. Agora já não era tão jovem, apesar de ser bem novo. Mas mesmo assim, sua grande ferida era a sua inadaptação com o possível das coisas, não estava em consonância com ele. Não queria encontrar um grande amor para se ater à vida, não queria que alguém o salvasse de si mesmo; e salvar-se de si mesmo é um heroísmo fadado à derrota, pois só se faz isso vencendo-se, ou seja, derrotando-se. Isso para ele era tão difícil, em todo momento de vitória se sentir em parte derrotado, seu por dentro se desmembrava e se abria em infinitas camadas discordantes e heterogêneas, as quais eram perpassadas por um finíssimo ranho de vida, que o permeava todo e estabelecia uma conexão mínima para que ele não se esvanecesse numa completa dissolução desintegradora. A loucura era a verdade, muita gente já havia falado.



POR: Marlon Tomazela Baptista.

2 comentários:

Anônimo disse...

Nasceu um novo espaco de amizades e encontros, com videochat, mapas, blogs, albuns de fotos, videoteca, música e noticias sobre Africa! www.africamente.com

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