quinta-feira, abril 27, 2006

meu mais belo vestido brega

Na janela do prédio em frente a minha tem um moço, com semblante um tanto quanto preocupado, que fica a teclar no escuro, fico tentando ouvir os sons das teclas pra ver se adivinho o que escreve, mas consigo não. Será que ele fala de delicadezas, será que trata de ciência, não posso saber, mas queria, qualquer dia grito eu daqui: - ei moço sério, que tanto escreve ae entre as sombras dessa sala escura, por acaso trata você de delicadezas? Mas não tenho esses disparates, de falar assim, com quem não conheço, por vezes coloco uma de minhas saias bonitas, pois gosto muito de saias, tenho umas que, dizem, são antiquadas, acho que só falam isso pra não dizer que são bregas mesmo, mas são! Não me importo não, são é bem bonitas pra mim. Mas, como ia dizendo, coloco uma dessas minhas belas saias e fico lá em baixo pra quando ele passar eu perguntar sobre o que trata aqueles seus escritus, não me enganei não eu gosto de dizer escritus com “u” mesmo. Uma certa vez eu fiquei lá, e ele passou, me gelou o estomago, quase falei, mas não pude, ai que raiva, não consegui. Então subi novamente e fiquei la na minha janela, e ele estava la com aquela cara preocupada, as vezes um quase sorriso, e eu tentando adivinhar, já vi umas vezes ele bebendo e escrevendo, ae me pergunto, será que trata ele de coisas sérias mesmo quando bebendo, não sei, pode ser, tem gente que faz isso, eu não consigo, pensar em seriedade enquanto beberico algo qualquer, mas ele talvez, tem jeito de quem faz isso, do que será que ele trata, queria tanto saber, será que ele é daqueles que escrevem coisas de literatura, olha só, pode ser, talvez trate de angústias, de tristezas, porque tem uns dias que ele ouve música um pouco alto e eu quase consigo ouvir, ouço la bem longe, e muitas dessas vezes são essas músicas bem tristes, da pra notar, e ele desanda a escrever, com música triste deve escrever coisas tristes também, porque quando eu fico a ouvir essas músicas me da um tristeza de quase chorar, confesso que as vezes até uma lágrima me escapa, porque de coisas sérias não se escreve enquanto ouve música triste e em volume tão alto, ah, não sei não talvez até de né, tem cada tipo por ae, mas qualquer dia desses eu coloco uma das mais belas saias que tenho e vou lá bater em sua porta só para perguntar do que tratam seu escritus.

colorido

amanhã vai ser assim: repetitivo, e nem tão colorido.

vermelho.

em vermelho, para não me repetir, pelo menos não em cores, ja que as coisas são ainda assim, com lágrimas espremidas nos cantos dos olhos, com caminhadas por ruas vazias e de tons amarelados, com a tal Dona a me visitar, angústias emaranhadas nas entranhas, ciência a perturbar a cabeça, músicas de cultivar tristeza, saudades e desejos, então, todas as coisas que tanto aparecem por aqui, por serem assim, tão parte de mim, queria poder dizer de coisas outras, mas eu ando meio que assim mesmo a me repetir, pois é, então ficamos assim, sem nada de novo a dizer, mas ao menos o faço em vermelho.m por aqui, por serem assim, t

quarta-feira, abril 12, 2006

vírgula.

foto de camila fontes, tem outras belas imagens no link ae do lado, beijo camila.


um cigarro e uma coca-cola, uma música e cinco minutos meu bem, o corpo que balança, os pensamentos que brincam com a fumaça, é só isso que eu te peço baby, cinco minutos pra eu me divertir com coca-cola e cigarro, só um tempinho sem ciência, sem amor, só eu, meu egoísmo, cigarro e coca-cola, só cinco minutos dançando sózinho, sem chorar, sem rir, vivendo assim, só pra mim, em torno do nada. eu gosto de cigarro, eu gosto de coca-cola, eu gosto de ti meu bem, mas as vezes eu preciso só disso: cinco minutos só pra mim, um cigarro e uma coca-cola.

sexta-feira, abril 07, 2006

angústia

Volta sentir aquele aperto no peito e aquele nó na garganta, mais uma lágrima se espreme no canto do olho, respira fundo e os pêlos dos braços arrepiam, é a sua antiga companheira Dona Tristeza que vem lhe visitar, agora acompanhada da já crescida Angústia, que até então brincava em suas entranhas como uma criança arteira. Como cresceu! Já é moça e fala de assuntos sérios, trata de compromissos e responsabilidades, mas que maturidade estranha, aquele moço que se pensava sério e já nem tão jovem se percebe um moleque, Angústia, mais que moça, é mulher e ele ainda tem em sua face pequenas espinhas entre a barba mal formada.
Quer chorar, quer colo e, ao mesmo tempo, parece cansar de sua boca salgar por lágrimas que insistem em rolar. Pára na sala escura, o silêncio lhe toma por inteiro, permanece por eternos instantes a olhar através do vidro, como se tentasse ver a si mesmo no reflexo mal formado, obscuros pensamentos, fracos devaneios, Angústia lhe traz momentos de tensão, de impaciência, de importâncias, lhe dá medo, lhe mostra dores até então desconhecidas. Tornou-se uma mulher insensível essa Angústia, Dona Tristeza é uma senhora de classe que sabe dizer um não com carinho, ela lhe machuca e você quase agradece, mas essa Angústia não tem a mesma classe nos modos de ser, ela tem se mostrado importuna, vai se encostando arrogantemente, passando por cima de todos não sei porque Dona tristeza anda trocando figurinhas com essa malvada, ele preferia quando Dona vinha acompanhada da Madrugada, e ficavam a ouvir sambas de histórtias de sofrimentos, Angústia não da espaço nem para música, ela é de um egoísmo ímpar.
Ele anda pelo apartamento tentando se esquivar e começa a tratar de se distrair com outros pensamentos, pensa em dar uma volta pela rua mas logo desiste, se joga no colchão no chão do quarto, mas Angústia se deita ao seu lado, lhe faz carinhos e lhe seduz, e cançado de lutar ele se entrega, e eles ficam a se amar por toda a noite. Com o dia ela foi embora, mas sua lembraça permanece e quase nunca lhe deixa.

quarta-feira, abril 05, 2006

não, vida real não.

Entra no ônibus, abre um romance, a parada final, todos descem e ele volta ao mundo real rodeado de ninguém, atravessa a porta entre corpos que sobem, tenta parar um momento mas o circular de gentes o leva até uma parede que, dessa vez, não pode atravessar, parado contra o cimento gelado, respira. Olha para os lados e fica assustado. É! É o mundo real. Rapidamente abre o livro e senta sobre os calcanhares, grita: - nãããããããããããão! As páginas em branco, nem sequer uma gota de tinta preta. – Nãããããããããããão!

terça-feira, abril 04, 2006

um moço um tanto quanto sério

Andava um tanto quanto preocupado aquele moço, dessas que não devem ser preocupações dos jovens, tem pela vida demasiado interesse, não só pela sua, mas pela de toda e qualquer pessoa, não entendam mal, não que seja um mexeriqueiro, ou algo do gênero, não é esse tipo de preocupação que nutre, mas aquelas de ordem existencial, preocupa-se com o mundo em todos os seus problemas, quem o vê vestido assim, com roupas joviais, dessas que esses roqueiros usam, com cinto todo adornado por coisinhas de ferro, sabem meus jovens leitores, pois então, ele é mesmo um tipo, quem o vê assim de tênis velho e usando esses penduricalhos, não imagina seu espírito gentio e aflito. Já lhe disse para ser menos rigoroso em seus pensamentos e menos preocupado com o rumo das coisas, que deve ir para a praia se divertir com jogos de bola e com o mar, mas ele insiste em ficar fechado dentro de casa, mas nem pra sair pra dar uma voltas para paquerar umas moças, não sei né, ir numa lanchonete dessas que os jovens vão, mas não, ele prefere ficar lá fechado lendo coisas, ah! mais assim esse moço vai acabar por adoecer, ta bom que no meu tempo eu ficava assim, sábado de noite em casa, não senhor, eu pegava minha noiva, ou ia com os companheiros mesmo, e ia pro baile, mais dançava de da gosto. No meu tempo não tinha essas preocupações de hoje, de ladrão e não sei o que mais, os jovens de hoje não sabem se divertir não, só que ouvem essas músicas alta, nesses lugares cheio de luzes e ficam pulando que nem uns tonto, não tem mais aquela coisa de chamar a moça pra dançar junto, agarradinho, eita, vocês não sabem o que é bom. Mas então, voltando a falar daquele moço, ele só se preocupa em ficar estudando e falando de coisa séria, o rapaz fica lá filosofando e pensando em problemas que nem tem jeito de resolver, se eu fosse ele eu deixava isso pra lá, convidava uma moça pra toma um lanche, ou até mesmo pra ir nesses lugares ae de música alta que os jovens de hoje vão, o que não pode é ficar assim, todo preocupado, ta sempre com cara de cansado, tem que se divertir né, ah tem sim.

segunda-feira, abril 03, 2006

Domingo

Tem momentos em que é melhor nem pensar, dias de sol, domingos de sol, quando entre os prédios do centro não se vê viva alma, quando o dia cai tão lentamente quanto a cinza do cigarro percorre os onze andares até se desmanchar no chão. Quando as torres da igreja calmamente espiam o movimento da procissão, quando o louvor chega a Deus em vozes de canção e o coração apertado sente o olhar perdido no vazio do quarto, entre vazios está a fumaça que insiste em brincar, em zombar de pensamentos de melancolia, e os momentos se vão quando o sol caprichosamente se deita ao mar e as sombras dos edifícios tomam conta da calçada, da rua. E, inesperadamente, a noite traz a chuva.
Ele sai a caminhar, cada gota lhe torna mais humano, desliza pelo cabelo, pela face e ele sente o úmido, o frio, o viver só entre o chão de pedras e paredes coloridas, sente o silêncio atrapalhado pelo o alarme que dispara, sente o corpo do homem que fede abaixo de uma marquise, sente a crença da velha solitária, que como ele, anda sem rumo, sente a vida que pulsa sonolenta em cada apartamento e se vê diante das grandes torres que o olham de cima num tom austero, quase se benze num reflexo de cristandade remota, olha para o décimo primeiro andar do prédio ao lado e as luzes apagadas anunciam os próximos momentos de vazio.
Sem acender a luz se dirige à janela, quando aberta, permite ao vento um circular vagaroso pela sala, a fumaça do cigarro, que começa a ser consumido pela brasa, dança em par com a brisa, lá embaixo a água faz do asfalto um negro brilhante, lá de cima as torres já não são tão imponentes e o último cigarro do maço se vai junto ao último minuto do domingo.

domingo, abril 02, 2006

décimo primeiro andar

Não há cortina em seu quarto, a claridade atravessa o vidro e se impõe, os olhos vão se acostumando entre um fechar e abrir irritado, o telefone insiste em tocar por pura provocação, o frenesi dos carros e o constante apertar de buzinas lhe dizem que existe vida lá fora, irritantemente existe vida. Arrasta-se até o banheiro, se debruça na pia, abre a torneira, com a mão em concha apanha um pouco de água e leva até a boca azeda, sente os fios da barba de quase homem não tão jovem e pouco velho, esfrega os olhos com certa impaciência, passa para a sala e alcança, bravamente, a cozinha, põe água no fogo e fica a ouvir, entre os rumores de existência externa, o barulhinho das gotas a borbulhar dentro da panela, logo o aroma do café lhe atrapalha um pouco o mau-humor, abre a janela da sala do décimo primeiro andar e acende um cigarro para o café acompanhar, lá embaixo, na rua estreita, carros e pessoas disputam espaço, lá em cima a fumaça do cigarro toma seu próprio destino e vaga no ar denso. Senta-se na janela e o estomago e a espinha ficam gelados, traga calmamente o cigarro e toma um pequeno gole no café já não tão quente, e então não ouve mais sons, as ruas desertas num tom melancólico de feriado e de domingo a tarde, ele anda pela rua e não há peso sobre seus ombros, não sente calor ou frio, caminha até o mar que nunca foi tão azul e permanece ali, olhando para lugar algum e sente-se leve, volta com uma felicidade infantil, que só se desfaz quando vê o seu corpo desfigurado afundado na calçada, mas não se lembra de como foi a queda por onze andares, talvez seu coração tenha explodido antes de alcançar o chão, talvez tenha se arrependido no meio do caminho, talvez nunca quisesse ter morrido, mas o fato é que não há mais peso sobre seus ombros.

sábado, abril 01, 2006

dês-existir

Mal havia começado a existir naquela bela tarde de sol, aquelas tardes que os jovens ficam encantados, aliás ele prefere uma bela noitada a uma bela manhã de céu claro, mas como ia dizendo, sua existência diária se fazia novamente e ele já estava no terceiro café e segundo cigarro, com dor de existência e de cabeça, com inveja de quando jovem, quando não havia ressaca, quando não havia compromisso com as letras científicas. Fica pensando em voltar para a cama e dês-existir, mas isso meu caro, é um privilégio dos jovens.