quarta-feira, março 29, 2006

tango

Quem o vê lendo no ônibus, pode pensar o quanto é sereno aquele moço, mas o que ninguém pode enxergar é o nó que insiste em lhe atravessar a garganta e lhe atrapalhar o pensar, em um olhar mais atento pode-se perceber uma pequena e teimosa lágrima sempre disposta a atravessar o samba.
Tem sido constante o tal nó a lhe sufocar os pensamentos e a garganta, lhe acompanha quando atravessa o mercado público pisando nos paralelepípedos como se fossem ovos, contempla a imponente construção e o confuso perambular de ninguéns comuns, entre cores e sons de vozes a comercializar bugigangas, entra pelas calçadas estreitas, espremidas pelas antigas construções de cores vibrantes e o tal nó lhe sufoca e espanta a primeira lágrima rapidamente absorvido pelo tecido verde de sua camisa.
No eterno subir do elevador por longos onze andares fica a flertar com sigo mesmo no espelho, moço vaidoso chega a achar interessante aquela face tristonha de olhos pequenos a apertar quase lágrimas, ao entrar as duas torres lhe saúdam e o tango toma conta do apartamento. Tango, entranhas, espasmos e a voz: “... vuelvo al sur, como se vuelve siempre ao amor, (...) vuelvo al sur, como un destino del corazón (...)”. E ele que foi ao sul se desmancha. E os onze andares sob os seus pés se desmancham e ele, estático, observa a poeira que levanta e cobre as duas torres a sua frente, ele, as torres, permanecem lá, imóveis enquanto o mundo cai ao redor, e o tango, cada vez mais alto, alimenta sua morte lenta.

3 comentários:

Marco disse...

digo o mesmo, e com gosto...

Anônimo disse...

Voltaste em grande estilo queridíssimo!Palavra de quem não é totalmente suspeita!
Beijinho

Anônimo disse...

é.eu sei, eu tbm sinto o nó.